sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Diário pessoal

O telefone toca. São onze horas da manhã, mas o relógio insiste em atrasar, afinal o horário de verão acaba no próximo dia dezessete. Ouço alguns barulhos como o arrastar de cadeiras, conversas pelo corredor, passadas de vai e vem, gente jogando água na escadaria da frente, e às vezes o tilintar de chaves. Como de costume, a minha sala está me congelando por conseguir absorver todo o vento frio que entra pela janela e eu não faço ideia da real sensação térmica do dia. Por ora, limito-me a fazer uma confissão: eu nunca tive um diário pessoal.
Esse depoimento pode parecer estúpido, considerando o tempo que me dedico a este blog. Escrevo sobre assuntos que modelam a minha personalidade, como a vida acadêmica, a vida familiar e religiosa, sobre o meu psicológico frente a essas vidas e, finalmente, sobre as pessoas que têm algum contato comigo, seja ele direto ou indireto. Basta surgir a vontade de escrever que eu me sento e redijo frases aleatórias. Em princípio, as palavras soltas e repetidas se mostram indiferentes, cumprindo apenas com o cargo de encher as linhas. No entanto, com a releitura do suposto texto e a conclusão de não fazer sentido, o editor entra em cena e é minha vez de atribuir cores àquelas palavras. Independente disso, jamais sei do que vou falar, não é meu forte criar expectativas.
Provavelmente, por impedir a criação de falsas esperanças, nunca tive um diário pessoal. Ainda que eu quisesse, não seria como Simone de Beauvoir que relia seus diários e ligava as emoções, quase sutis, aos acontecimentos históricos, tal como a Segunda Guerra Mundial. Não seria também como Virgínia Woolf, que com o seu fluxo de consciência, alcançou notoriedade falando de temas relacionados à condição feminina; ela que tinha o anseio de voltar ao seu diário "depois de um ou dois anos e descobrir que esse conjunto organizou-se por si mesmo, apurou-se e fundiu-se". Nem mesmo seria Jean-Paul Sartre que fazia descrições em seu relato autobiográfico dos autores de obras clássicas que ele lia, misturando as características pessoais com o formato dos livros e a disposição deles nas prateleiras. Essa descrença de não ser o espelho desses ícones se deve à única razão da minha escrita ser diferente e, se eu buscasse me assemelhar, tiraria o brilho que eles possuem para mim. Além disso, eles integram o grupo de pessoas que moldam a minha personalidade, influenciam o meu desenvolvimento enquanto leitora, mas por que eu não admito, não me determinam enquanto pessoa e escritora e, só assim, fazem-me ser o que sou.

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