segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Realce

Deixando-me levar por esses depoimentos que agradecem o ano que passou, eu começo o meu último dia do ano a relembrar as principais emoções que vivi. Janeiro: é o mês que dá continuidade às tão esperadas férias da Universidade, um verdadeiro descanso para quem se desgastou em provas, trabalhos. Em suma, nada além de ficar em casa e fazer os corriqueiros downloads de músicas, filmes, e foi justamente nesta época em que o FBI fechou o maior site de armazenagem de arquivos: Megaupload. Um desastre imensurável! Mas passou e, com o correr dos dias, encontrei outros sites com uma qualificação próxima.
Ainda abalada pela notícia e pelas tentativas vãs de baixar algum arquivo daquele endereço indisponível, no início de Fevereiro, fui à praia. Os pés na areia, os cabelos rebeldes pelas lufadas do vento ao som das ondas do mar. Uma experiência quase indescritível, pois, ao mesmo tempo em que relaxa, empolga. Os três dias de estada na casa de madeira subtraíram as preocupações que invadem a mente de pessoas ocupadas com estudo, trabalho e afazeres domésticos. Um tratamento psicológico que pode custar caro, mas tão ou mais eficaz que agendar consultas.
Com os nervos acalmados, senti-me pronta para iniciar as aulas. Sabia que a maratona me aguardava repleta de novidades, desde estágios até diversas leituras; e Março era o mês que apresentaria a maioria dessas surpresas. Uma delas, inclusive, apontava para uma viagem a Florianópolis com a finalidade de expor meu trabalho do projeto de extensão. A adrenalina tomou conta de mim aos poucos e eu só me dei conta muito tempo depois. Neste mesmo mês, o Centro Acadêmico de Letras fez sua aparição oficial na Uepg e eu gravei um vídeo em homenagem a todos/as os/as estudantes do curso.
Academicamente falando, no mês de Abril, as surpresas não paravam: compareci à escola onde as observações seriam feitas e conheci a turma da regência. Quanto às minhas preferências musicais, eu passava por uma transição radical: de Madonna a AC/DC. Se eu me considerava uma ouvinte obsessiva e assídua em relação à cantora, à banda eu duplicara. Com outro site de downloads na barra de favoritos, baixei os álbuns Highway to Hell e Back in Black  na medida em que lia a biografia dos componentes da banda. A paixão por Bon Scott não foi instantânea, ainda que eu já o preferisse em comparação com Brian Johnson. Reconheço o talento dos dois, mas a performance do cantor escocês acabou chamando mais a minha atenção: suas caras e bocas e sua camiseta de Superman.
Foi nesse clima de mudança de gênero musical que viajei a Florianópolis na companhia de uma colega da sala, em Maio. Sob a luz do luar, ao lado de duas colegas e da minha orientadora, recebi uma mensagem de texto via celular do rapaz que eu nutria certo encanto. Meu coração pulsava descontroladamente e não pude disfarçar a emoção a tal ponto que compartilhei a notícia com as demais. Eu já o conhecia há algum tempo e a oportunidade de conversarmos era quase nula, senão pelo celular. O estado de Santa Catarina nunca mais soou igualmente depois desse ocorrido e o sentimento que nascia durante as horas que trocamos as mensagens me perseguiria depois. Afinal, por trás das letras das canções Jailbreak, Dirty Deeds Done Dirt Cheap ou Touch too Much estaria a expressão daquele rapaz e eu as associaria a ele num ato involuntário para alimentar os meus devaneios.
Em Junho o celular cessaria os alertas das mensagens que eu tanto adorava ver e só me conformei por já ter encontrado o rapaz pessoalmente. Entretanto, eu deixava de carregar um peso nas costas, pois as regências obrigatórias haviam sido cumpridas. Cinco noites preparando os materiais para as aulas que contavam com a participação dos/as alunos/as. Se eu pudesse me basear somente nesse primeiro semestre, como professora, a minha carreira profissional visava ao que se chama de bem-sucedida, não pelos elogios ou pela atmosfera contagiante da sala, mas pelo resultado que obtive na autoavaliação.
Como os deveres aparentemente estavam mais leves, Julho foi o mês dos eventos. Num deles, duas amigas e eu combinamos de dormir juntas após o show com o objetivo de dar risada, falar besteira à vontade, pois os donos da casa se ausentariam. Pés cansados e maquiagens borradas tornaram-se registros. Sobre a cama havia um pacote de bolachas wafer e na mão de cada uma das três que estavam sentadas, um copo de achocolatado. Enquanto devorávamos as guloseimas, passamos o resto da madrugada a contar as anedotas de cada uma, sob diferentes pontos de vista e vimos o sol nascer. Era hora de dormir.
A culpa só não adquiria uma postura negativa para mim porque eu estava frequentando a academia. Eu sabia que naquela noite o chocolate aumentaria a chance de engordar alguns quilogramas e acentuaria o meu sedentarismo, porém, impus a mim mesma que meia hora de esteira atenuava o suposto delito contra a saúde. Em Agosto, esse jogo de perder caloria foi posto em prática e, além de demarcar algumas curvas, eu ampliei meu círculo de amizades. Conheci pessoas extraordinárias, portadoras de um senso de humor inabalável e de conteúdo digno de ser imitado.
Essas amizades continuaram com a mesma intensidade durante os meses de Setembro e Outubro. A interrupção das conversas se deu porque eu fui à praia novamente e parei de ir à academia. Contudo, foi nesse período de tempo que me inseri num Movimento Estudantil. O Diretório Central dos Estudantes da Uepg estava em época de eleição e a chapa 2 - Movimentando Esse Trem - me convidou para ser colaboradora. Presenciei reuniões em que os debates emanavam a palavra luta sem ela ser proferida e acabei sendo influenciada. Vi-me diante de gente considerada importante naquele espaço e confiei na capacidade do grupo que eu apoiava. A votação feita em Novembro teve como apuração a vitória da chapa 2 e meu orgulho pela militância de todos/as era imenso.
Em comemoração, o Movimentando Esse Trem organizou "A Outra Festa!" em Dezembro, a segunda festa desse grupo no DCE, e colaborei com a programação ao convidar uma banda de pop rock da qual um amigo faz parte. Passada a festa, foi a vez do meu aniversário, uma data que possui o caráter desastroso por carregar a temerosa farda da responsabilidade. Tirei algumas fotos para protagonizar casos capciosos, gerando alguns comentários... Comemorei o Natal transformando o cenário do meu quarto, comprei umas revistas com partituras para desenferrujar meus dedos no teclado que há anos não toco... Assim fecho o ano letivo e o ano comercial. Não espero nada de mais de 2013 desde que ele me estimule a escrever e realçar seus pontos positivos assim como eu explorei de 2012.

Sonho

”Quando eu era criança tive um sonho – Eu queria ter a minha própria bicicleta. Quando ganhei uma bike eu devo ter sido o garoto mais feliz de Liverpool, talvez do mundo. Eu vivia por ela. A maioria das crianças largavam suas bicicletas no quintal durante a noite. Não eu. Eu insistia em guardar dentro de casa e na primeira noite eu ainda mantinha na minha cama.”

John Lennon

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Desdém

Às vezes pareço ter o mundo nas mãos e, na verdade, quando me dou conta, eu não tenho coisa alguma. Culpa dessa época natalina, ela me deixa meio sentimental, com os nervos inquietos. Um aglomerado de emoções que eu tento engolir ao longo do ano, mas instintivamente emerge nessas datas em que supostamente a família se une e parece ser feliz. Ausências e desdém. Um amargo que me sobe à boca e só atinge ao desabafo por meio de um texto, e então eu consigo me sentir menos carregada de más energias. A corrosividade me consome na medida em que alguém profere um "sincero voto". Abraços e sorrisos forçados despertam ainda mais a minha fúria e só me afastam do suposto objetivo da comemoração; afinal é calada e sozinha que me sinto melhor. E daí que é Natal?

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Acasos

Uma terça-feira ensolarada, o corredor lotado de pessoas a fazerem comentários sobre a entrada na sala de aula. Os primeiros passos estavam sendo estudados, afinal éramos onze calouros/as. Parecia que ao nos apresentarmos, quem já se conhecia não toleraria nossa presença por muito tempo simpaticamente. Ainda que de contragosto, enfrentamos o nosso receio comum e finalmente nos inserimos naquele grupo já familiarizado.
As professoras daquele dia eram meio sem sal e as disciplinas também. Construí tudo muito diferente em minha imaginação, desde a sala de aula até as próprias pessoas que a ocupavam. Era uma tagarelice tão dispensável que me chegou a dar dor de cabeça. Cheguei a casa exausta, faminta e irritada. Deitei no sofá e rememorei o exato momento em que li ter sido aprovada para frequentar a UEPG e comparei ao meu cansaço físico e mental. Às vezes sonhamos alto demais e nos esquecemos de colocar os pés no chão.
Os dias decorreram-se a tal modo, sem graça. Passei para o segundo ano e descobri as cores do curso, que a grade curricular atendia as minhas expectativas, pois eu gostava de entender o período da lateralização, a diferença da gramática normativa e da internalizada, as dicas escolares nos documentos oficiais. Inclusive foi nesse ano que escolhi a minha orientadora para o Trabalho de Conclusão de Curso. O ano voou e o terceiro ano estava sorrindo para mim. Independente de ser a Highway to Hell ou Stairway to Heaven à minha espera, os acasos ainda não haviam começado.
O terceiro ano tem uma peculiaridade no curso de Letras: a oportunidade de selecionar determinadas disciplinas como optativas ou eletivas. Graças aos boatos no "rádio corredor", a Língua Alemã foi a minha opção por ter grande carga cultural. Justamente aí se encontrava o cerne dos acasos e da mudança que explodiria em meus dias. Eu arcaria com as consequências, boas ou ruins, a partir desse caminho. Só neste terceiro ano que a paciência adquiriu um aspecto de virtude para mim; eu notei que ela pode nos salvar ou nos condenar. Se for o último efeito, traz arrependimentos.
A minha sorte é que esses arrependimentos não me algemaram como de costume, ao contrário, eles me encorajaram a tomar atitude e ser franca. O motivo: um rapaz. Desde o primeiro ano eu o conheço e nunca havia me dado o luxo de me imaginar ao seu lado. Ele participava das aulas mais do que os/as outros/as acadêmicos/as, por ser comunicativo e inteligente e, apesar disso, essas qualidades não me despertavam o mínimo de interesse. Até mesmo porque, na época, eu estava cumprindo um acordo de ser fiel. Contudo, quando eu já estava absolvida desse contrato, foi nas aulinhas de alemão que as sobrancelhas começaram a se comunicar. O suficiente para eu perceber que ele tinha chance comigo e que eu tinha chance com ele.
Foram meses de espera, mensagens não respondidas, respostas vagas, fugas, aulas ausentes, olhares tímidos e receosos, e nada adiantou: um dia eu me renderia aos encantos do poliglota e das suas cantadas infalíveis. Eu diria que estaria feliz por receber suas mensagens e quase sem querer, eu lembrar-me-ia dos momentos mais remotos e concluiria, por fim, que a paixão me agarrara sutilmente. Dispor-me-ia a declarar-me destemidamente ao Psycho Killer, até mesmo para confessar-lhe que agora o arrependimento me acompanha devido aos meus caprichos orgulhosos. Não é um "Ich liebe dich", mas alguma coisa misteriosa há nessa história e sei que ambos estão dispostos a desvendá-la.

sábado, 15 de dezembro de 2012

Limãozinho

Dupla personalidade: é ela que vem e que passa. Podre de rica: qualidade que não faz parte da realidade da moça. Seu perfume recende de Rio Grande do Sul a Amazonas e não tem como não torcer o nariz para ela: ou pelo seu modo de arrogante de ser, ou pelo excesso de fragrâncias adocicadas. Um caminhar resoluto, uma mente cheia de abobrinhas e a boca não para de falar.
A Moça. Ela que não faz parte de tanta mocidade assim, o que não significa que seja anciã. Longe disso. Está mais para uma mademoiselle que adora ser admirada. A presença mais marcante, a voz mais audível que chega a cortar o raciocínio dos senhores que se sentam àquela mesa. Os olhares se concentram em seu cabelo, mas logo percebem que não é de bebê, isto é, foi remodelado ao longo dos anos para chegar nisso. Há grandes chances de essa moça acreditar que a aparência é o ingresso para qualquer lugar. Ainda que possua cérebro e faça uso dele com certa frequência, o corpo é perceptivelmente sua grande preocupação.
Tudo isso não passa de garantir a transmissão de uma boa imagem, o que é tão recorrente graças ao avanço das máquinas fotográficas. Por intermédio do que outrora era um evento banal, os vestidos, penteados, sapatos são razões de elogio e inveja. Fatores que alimentam o contentamento de quem não tem ocupação de responsável demanda, de quem não sabe mais como chamar a atenção. Enquanto as páginas são abertas em abas para os registros serem contemplados em concomitância, os livros mofam em cima da cama ou do criado-mudo.
Para enriquecer a descrição, além de tudo isso, quase que uma obrigação, há o charminho. Sem ele não tem como criar uma personagem. O tal charme se baseia em gastar dinheiro às soltas com decorações fúteis e penduricalhos; em fazer voz fina com alusão à criança de dez anos ou com idade inferior; em dar passos miudinhos quando se está na presença de animais; e estampar uma irritação com a finalidade de ser o foco central das conversas e olhares se os desejos não forem atendidos prontamente.
Uma futilidade sem tamanho, beirando à irritabilidade. Mais desnecessário que esse comportamento é o nascimento de quem o possui. Trata-se de crítica mental, fruto das minhas considerações em cada deslize alheio. Se o objetivo é chamar a atenção, há certo triunfo, pois esse texto não teria desenvolvimento. Contudo, é uma análise que desmerece os valores e retira a máscara de cordeiro do mais perigoso animal. Desconfiando dessas gentilezas, aprendi a enxergar os defeitos, aprendi a não amar e certifiquei-me de que não há dignidade maior do que ter compaixão. Pobre criança de temperamento azedo.

domingo, 9 de dezembro de 2012

Opostos

Vou confessar: eu ainda penso em você. Não com a mesma intensidade de quando nos víamos frequentemente, até porque a lembrança não é nítida. Pouco importa, pois, se nos poucos instantes em que te vejo, minhas mãos tremem e reajo sempre como a "garotinha apaixonada". Os meus olhos ficam inquietos, ora por timidez, ora por felicidade. Você nem percebe, é muito distraído e desapegado para notar esse comportamento. É difícil passar por cima do meu orgulho e admitir que sinto falta dos teus olhos e da tua conversa desconexa.
Cheio de defeitos, repleto de qualidades. A seriedade exposta na cara com um toque sutil de malícia. Eu desvendando os traços do teu sorriso. O mundo inteiro servindo de plateia e todos/as desconheciam o efeito que o nosso encontro me causava. Frases mal formuladas, coração pulando, eu criava mil cenários e trilhas sonoras e você ali, tão perto e tão distante. Perturbável sensação que alimenta os meus devaneios: a realidade jogada na mesa. Quanto mais você falava, mais descrições e lembranças bobas alimentariam a ilusão de ter você ao meu lado.
Hoje isso tudo não passa de recordação. Não é um passatempo ruim, afinal lembrar você me faz bem na medida em que não te vejo e te ver me faz mal na medida em que você não me vê. O remédio e o veneno numa pessoa só; e enquanto eu não morro, sigo com essa obsessão de não te apagar da memória, pois foi a saída que encontrei para não te perturbar. O meu celular me acusa por não te ligar e assumir de uma vez que ainda gosto de você, mas quando me rendo, o espelho se encarrega de mostrar a minha covardia. Por isso, recuo. Há ainda a tua janela que me convida a chamá-lo, pois ela tem razões suficientes para saber como a tua ausência me consome. Apesar de tudo, o máximo que consigo fazer é redigir um texto ao som da tua música favorita e te lançar ao anonimato.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Dia perfeito

Era só mais uma data comemorativa num dia com céu azul. O seu aniversário sempre teve esses galanteios da natureza, pois o clima agradável contribuía para o bom humor, afinal ela achava que o ânimo dependia muito da temperatura e dispersão das nuvens. O cantarolar dos sabiás alegrava ainda mais aquela manhã e tudo que viesse depois seriam apenas resultados de um dia bonito. A expressão com qual encarara a janela às sete era um convite para as vibrações positivas.
Da casa ao trabalho, do trabalho a casa. Constante fuga de pessoas falantes e um desejo ardente de aproveitar cada minuto das horas que ela tinha para comemorar. Seu nome é uma incógnita, assim como a sua personalidade. Ela não tinha muito tempo e as horas saltavam. Nem bem o almoço fora servido e ela já se via esperando pelo ônibus. Um tédio poderia nascer, mas a lembrança de ser o seu aniversário apagava qualquer indício de desânimo.
Carregando tais emoções oscilosas dentro de si, ela percorreu as ruas com passos apressados, reflexivos. O vento penteava seus cabelos delicadamente, e as pessoas pareciam mais bonitas, joviais. De qualquer modo, um dia especial estava ali, a seus pés, em suas mãos e a maior falha era não saber utilizá-lo adequadamente. O quatro de Dezembro servia de estímulo para as suas gargalhadas serem agudamente sinceras, pois chegar até ele esbanjando saúde e desprovida dos empecilhos acadêmicos eram razões suficientes. O dia era dela e de ninguém mais.
Um amigo falava de religião e a conversa fluía de modo elegante. Fotos para documentar fatos e desvendar mistérios não problematizados. Celular desligado. Dinheiro. Twitter. Nietzsche. Deus. Confiança. Você. O resumo daquele pátio e a ação em segundo plano. Confissões públicas, espanto e timidez. Xaveco. Sósias. Namoro. Mãos dadas. Ironia. O dia perfeito do Cachorro Grande ou a primeira banda do Eric Clapton? Nada mais que amigos, nada menos que namorados. Fixação por olhos. Desenhos. Admiração. A mentira omite o que a sinceridade assusta. Boatos.
O Gênio Enigmático caminhava descontraídamente pelas calçadas de Ponta Grossa enquanto um transporte público atravessava a avenida. Avistara um rapaz de bege, era ele. O coração disparou, as mãos transpiraram e os olhos fitos rejeitavam a passagem das outras pessoas naquele ir e vir incansável. A comemoração, que estava marcada para a noite, ficaria ainda mais colorida com a recordação desse momento. O sorriso cativante, o brilho nos olhos e o aceno com a mão em empenho para ser notado. Um ato bem sucedido e que acarretou sentimentos já derrubados pela primavera de Setembro. O mesmo vento que antes penteava seus cabelos tinha o encargo de soprar as folhas do passado. Essas que ainda flutuam na mente dois ponto um, fazendo com que Patrícia, ou seja lá qual for o seu nome, sinta a paixão renascer. Ilusão ou não, ela está ansiosa por rever em breve aquele rapaz.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Equívocos

Vinte horas. Reunião em frente ao Café. Murmúrios das pessoas. Eu não conhecia ninguém. Insegura, desci as escadas, tentando não deixar que a esperança de reconhecer alguém escapasse. Sentei-me numa daquelas cadeiras, afastada de todos/as. Temi o novo e, por essa razão, parecia estar encarando os outros, mas era apenas timidez. Com a cabeça meio tombada para frente e com os olhos semicerrados, eu avaliava aquele grupo à direita, de esquerda.
Sempre me sinto assim em situações que eu não sei como correrão. Dizem que a gente não nasce sabendo. Já tentei fazer dessa frase a minha filosofia de vida e me sentir menos atacada pelos sentimentos que nascem em mim. Contudo, não é tão simples ficar me lembrando a cada instante que eu não nasci sabendo, que ninguém nasceu sabendo e, que talvez, ninguém provavelmente ainda saiba. Afinal, ninguém tem a fórmula exata de como viver, e nem sabe como formulá-la. Uns dizem que dinheiro não traz felicidade, outros fazem dele o abrigo, o conforto, a fuga da solidão. Eu só queria ser mais segura. Gaguejar menos. Pé firme e cabeça erguida.
Pouco tempo depois, sozinha, notei um amigo meu, que até aquele dia havíamos trocado umas poucas palavras, aproximar-se. Ele não é o que se dizem a ótima companhia, porém estava ali, dava a impressão que eu não era tão alheia à sociedade. Sentou-se sem pedir licença e começamos uma conversa maluca. Misturávamos assuntos acadêmicos com frutos da imaginação. Cogitamos em escrever um conto a quatro mãos. A conversa ficara entusiasmante a cada tópico adicionado.
No auge dessas propostas, alguns integrantes daquele grupo se deram conta de que eu também fazia parte da manifestação e vieram me dar boas vindas. Com uma leve alteração de temperatura na face, eu agradeci. Agradecer a um estranho faz-me agir como uma idiota. Contento-me em ter a certeza de que ninguém lê meus pensamentos, ou, mesmo que existisse alguém com esses poderes, o resultado da análise em abstrair algum sentido, de tão complexo, não seria imediato. Digo isso, pois tentei inovar mentalmente o agradecimento, em vão. Ainda que não perceptível, eu me sinto boba. Um "obrigada" parece tão clichê e foi a única saída que encontrei.
Sob as árvores, em outras dimensões daquele lugar, vi-me diante do tal grupo. Às escuras, cada um se apresentava. O desespero foi tomando conta de todos os meus nervos na mesma rapidez com que o nome, o curso e o ano eram proferidos. Novamente, fiz e refiz milhões de apresentações, e consegui emitir sofregamente o meu nome e o curso. Perguntaram-me o ano, pela falta dele. Que desastre! Com tantos tropeços, a imagem que passo é de uma pessoa que não gosta de falar, de se socializar. Uma concepção errônea, porque são inúmeras as minhas tentativas de prosseguir uma conversa. 
Numa delas, graças ao meu curso, ouço piadas infames e, certa vez, respondi a supor que transmitia a ideia de também possuir um humor elevado, via Internet. O sentido foi absorvido com êxito e, desde então, o piadista e eu somos colegas. Somente paguei e ainda pago o preço de arriscar as possíveis futuras amizades com esses lapsos humorísticos. Atingi alguém que depois seria o centro das minhas atenções. Sem conformar-me, busquei conversar, ser simpática e de nada resolveu. Ou eu gosto do sofrimento, ou já estava escrito que não teríamos uma relação amistosa... De qualquer modo, culpo-me por isso a cada vez que o vejo.

Sem você


nenhuma  metáfora
traduz      a falta
nenhuma  imagem
exata

faca       encravada
nesse     silêncio
dia         sem dia
piada     sem graça
acordar  sem você
me         mata

-- Frederico Barbosa
 

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Idealismo

Falas de amor, e eu ouço tudo e calo
O amor na Humanidade é uma mentira.
É. E é por isto que na minha lira
De amores fúteis poucas vezes falo.

O amor! Quando virei por fim a amá-lo?!
Quando, se o amor que a Humanidade inspira
É o amor do sibarita e da hetaíra,
De Messalina e de Sardanapalo?

Pois é mister que, para o amor sagrado,
O mundo fique imaterializado
— Alavanca desviada do seu fulcro —

E haja só amizade verdadeira
Duma caveira para outra caveira,
Do meu sepulcro para o teu sepulcro?!


-- Augusto dos Anjos.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Orgulho

Se os dias não ziguezagueassem tanto e não alternassem entre o alto e o baixo, a agitação e a calmaria, o calor e o frio, não haveria justificativas para se ter paciência em escrever um texto. Se eles não começassem extremamente cedo e não terminassem tão tarde, essas palavras seriam guardadas para outra ocasião. Além disso, se as pessoas das mais variadas características e idiossincrasias não povoassem os lugares que frequento, nada disso teria razão de ser comentado. A linha tênue entre a vitória e a perda, o sorriso e a lágrima, a educação e a grosseria.
Terça-feira: com um atraso de cinco minutos, logo pela manhã meu celular já possuía três chamadas perdidas de contatos distintos. Não é a fama, é a responsabilidade chamando por mim. Sento-me na cadeira reservada para a minha ocupação temporária e é hora de trabalhar. Remunerado ou não, eu estaria agindo amigavelmente, sem que se pudessem existir reclamações. Ao preencher setecentos e setenta e seis papéis, com olhos fixos e atentos, com algarismos miúdos no canto direito superior, o tempo corria. Em poucos instantes, um grupo de seis pessoas necessitaria da minha atenção. Recepcionei-o da maneira que gostaria de ser atendida. Logo depois, outra aglomeração se aproximava e após isso, a enumeração daqueles papéis seria interrompida constantemente.
Contudo, eu estaria satisfeita em servir e foi assim que permaneci por dois períodos naquela mesa. Lembrei-me do quanto os meus colegas lutaram e do quanto eles desempenharam o seu cargo levando qualquer detalhe a sério. Elogios e críticas eram considerados em seus discursos. Víamos o lado bom em tudo, além da confiança em estarmos fazendo a nossa parte e auxiliando no processo de mudança. A diversão mostrava a sua cara até mesmo em momentos de possíveis conflitos e eu me sentia orgulhosa de ter aceitado a proposta de me incluir nessa manifestação. Sabia que o benefício atingia a ambos. A válvula que nos impulsionava éramos nós mesmos.
A noite caía, a chuva também, e o meu ânimo nem havia oscilado. Eram vinte horas e os meus olhos estavam sedentos de pessoas naquele hall. A participação de todos/as alimentava a sensação de sermos vitoriosos. Até que, às vinte e uma horas, a reunião dos concorrentes foi feita. A apuração só se deu a partir da meia-noite devido às cláusulas a serem lidas, explicitando as possíveis falhas e suas respectivas penalidades. A curiosidade de saber da votação de cada urna com os meus próprios sentidos apontava violentamente em mim, mas àquela altura, eu já estava estendida sobre a minha cama trocando mensagem com um aliado meu. O clima era mesmo de campo de guerra.
Com a informação de que o início se daria mais tarde do que o esperado, aquele corpus textual adquiriu a função de conselheiro, o qual me induziria a descansar. Aceitei largar das mãos da curiosidade e me jogar aos braços do sono, pois ele já estava me provocando há um tempo. O meu quarto ia escurecendo lentamente com o fechar dos meus olhos e a mente repetia "A primeira coisa a se fazer amanhã é checar o resultado". Oito horas depois, acolhida na sala em que faço os meus planejamentos acadêmicos, recorri ao computador. Com os dedos apressados e ágeis em razão da curiosidade que os movia, a Internet não respondia os meus comandos devidamente até que... "Vencemos!" O contentamento exibiu-se por meio de olhos brilhantes e dentes à mostra. A galera aprovou e escolheu a nossa movimentação. Fechei a página e senti o orgulho dobrar-se: de mim e de todos/as que acreditaram em nós.