segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Stricto sensu

Há uma semana minha orientadora solicitou-me que eu viesse um pouco mais cedo do que o costume no local onde trabalho durante esta semana. Tal pedido se deve ao início das inscrições para o curso chamado "Equidade na Pós-graduação: Formação Pré-acadêmica" oferecido pela UEPG, o qual tem como público alvo os negros e indígenas que ingressaram na Universidade por meio do sistema de cotas e concluíram o ensino superior. Seu objetivo é a preparação, o aperfeiçoamento para a pós-graduação. Ainda que não garanta a entrada no curso stricto sensu, é uma oferta valiosa para quem deseja se promover no mercado de trabalho.
Entretanto, apesar de ser o primeiro dia e não se passou nem uma hora que estou aqui, ainda não apareceu nenhum interessado. Tento me convencer de que as pessoas que desejam esse avanço não ficaram sabendo ou não puderam estar aqui o quanto antes. Mas, ainda assim, há um recurso viável para quem trabalha no período da manhã: o envio do formulário preenchido para a inscrição por correspondência. Por isso, não há desculpas pela falta, a menos que, repito, não tenha conhecimento dessa proposta.
Além de mim, há também a coordenadora desse curso que notou esse "atraso". Ela me falou, em resposta à minha reprovação pelas pessoas não comparecerem, que elas só virão nos últimos dias. Confessei à ela que se eu fizesse parte do público alvo, estaria no primeiro lugar da suposta fila e, para minha surpresa, a professora coordenadora disse que no próximo ano eu posso estar como ouvinte. O certificado eu não receberei, mas a apresentação do trabalho e o conhecimento dele, sem dúvida. São as primeiras vantagens de estar incluída num projeto composto por pessoas que priorizam a equidade na educação.
Então não é de todo ruim estar aqui à espera de uma alma viva, pois já fui contemplada com um convite. Só de saber que eu posso estar dentro de uma sala em que o mestrado é o foco, já me sinto importante. Importante no sentido de ter condições para seguir esse caminho e de ter feito a melhor escolha enquanto acadêmica do terceiro ano.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Ler devia ser proibido - Guiomar de Grammont

A pensar fundo na questão, eu diria que ler devia ser proibido.
Afinal de contas, ler faz muito mal às pessoas: acorda os homens para realidades impossíveis, tornando-os incapazes de suportar o mundo insosso e ordinário em que vivem. A leitura induz à loucura, desloca o homem do humilde lugar que lhe fora destinado no corpo social. Não me deixam mentir os exemplos de Dom Quixote e Madame Bovary. O primeiro, coitado, de tanto ler aventuras de cavaleiros que jamais existiram meteu-se pelo mundo afora, a crer-se capaz de reformar o mundo, quilha de ossos que mal sustinha a si e ao pobre Rocinante. Quanto à pobre Emma Bovary, tomou-se esposa inútil para fofocas e bordados, perdendo-se em delírios sobre bailes e amores cortesãos.
Ler realmente não faz bem. A criança que lê pode se tornar um adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzido a crer que tudo pode ser de outra forma. Afinal de contas, a leitura desenvolve um poder incontrolável. Liberta o homem excessivamente. Sem a leitura, ele morreria feliz, ignorante dos grilhões que o encerram. Sem a leitura, ainda, estaria mais afeito à realidade quotidiana, se dedicaria ao trabalho com afinco, sem procurar enriquecê-la com cabriolas da imaginação.
Sem ler, o homem jamais saberia a extensão do prazer. Não experimentaria nunca o sumo Bem de Aristóteles: o conhecer. Mas para que conhecer se, na maior parte dos casos, o que necessita é apenas executar ordens? Se o que deve, enfim, é fazer o que dele esperam e nada mais?
Ler pode provocar o inesperado. Pode fazer com que o homem crie atalhos para caminhos que devem, necessariamente, ser longos. Ler pode gerar a invenção. Pode estimular a imaginação de forma a levar o ser humano além do que lhe é devido.
Além disso, os livros estimulam o sonho, a imaginação, a fantasia. Nos transportam a paraísos misteriosos, nos fazem enxergar unicórnios azuis e palácios de cristal. Nos fazem acreditar que a vida é mais do que um punhado de pó em movimento. Que há algo a descobrir. Há horizontes para além das montanhas, há estrelas por trás das nuvens. Estrelas jamais percebidas. É preciso desconfiar desse pendor para o absurdo que nos impede de aceitar nossas realidades cruas.
Não, não deem mais livros às escolas. Pais, não leiam para os seus filhos, pode levá-los a desenvolver esse gosto pela aventura e pela descoberta que fez do homem um animal diferente.
Antes estivesse ainda a passear de quatro patas, sem noção de progresso e civilização, mas tampouco sem conhecer guerras, destruição, violência. Professores, não contem histórias, pode estimular uma curiosidade indesejável em seres que a vida destinou para a repetição e para o trabalho duro.
Ler pode ser um problema, pode gerar seres humanos conscientes demais dos seus direitos políticos em um mundo administrado, onde ser livre não passa de uma ficção sem nenhuma verossimilhança. Seria impossível controlar e organizar a sociedade se todos os seres humanos soubessem o que desejam. Se todos se pusessem a articular bem suas demandas, a fincar sua posição no mundo, a fazer dos discursos os instrumentos de conquista de sua liberdade.
O mundo já vai por um bom caminho. Cada vez mais as pessoas lêem por razões utilitárias: para compreender formulários, contratos, bulas de remédio, projetos, manuais etc. Observem as filas, um dos pequenos cancros da civilização contemporânea. Bastaria um livro para que todos se vissem magicamente transportados para outras dimensões, menos incômodas. E esse o tapete mágico, o pó de pirlimpimpim, a máquina do tempo. Para o homem que lê, não há fronteiras, não há cortes, prisões tampouco. O que é mais subversivo do que a leitura?
É preciso compreender que ler para se enriquecer culturalmente ou para se divertir deve ser um privilégio concedido apenas a alguns, jamais àqueles que desenvolvem trabalhos práticos ou manuais. Seja em filas, em metros, ou no silêncio da alcova. Ler deve ser coisa rara, não para qualquer um.
Afinal de contas, a leitura é um poder, e o poder é para poucos.
Para obedecer não é preciso enxergar, o silêncio é a linguagem da submissão. Para executar ordens, a palavra é inútil.
Além disso, a leitura promove a comunicação de dores e alegrias, tantos outros sentimentos. A leitura é obscena. Expõe o íntimo, torna coletivo o individual e público, o secreto, o próprio. A leitura ameaça os indivíduos, porque os faz identificar sua história a outras histórias. Torna-os capazes de compreender e aceitar o mundo do Outro. Sim, a leitura devia ser proibida.
Ler pode tornar o homem perigosamente humano.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

LINGU@GENS: O QUE SIGNIFICA “CARALHO”?

LINGU@GENS: O QUE SIGNIFICA “CARALHO”?: Segundo a Academia Portuguesa de Letras, “CARALHO” é a palavra com que se denominava a pequena cesta que se encontrava no alto dos mastros d...

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Sonho ou Pesadelo?

Ontem nossa turma conheceu duas professoras que prometem fazer deste ano o cume de preocupações. A primeira tem como disciplina o estágio. O temido estágio. Para iniciar, ela nos propôs a corriqueira auto-apresentação: "qual seu nome e o que você espera deste ano". Ainda que queiramos que ele seja tranquilo, ninguém insinuou tal anseio, ao contrário, mostramos ansiedade e (des)confiança. Depois de elencarmos três escolas que possivelmente serão os campos dos nossos estágios, essa professora para nos acalmar disse que grava nome e rosto rapidamente. Traduzindo: "não trapaceiem, estarei de olho!". Ficamos bem "relax".
Como disse, foram duas professoras, por isso, cabe descrever, segundo minha percepção, a subsequente. Detalhe: a aula seguinte se inicia às três e vinte, eu entrei na sala às três e meia, portanto, comecei bem! (dizem que a primeira impressão é a que fica...) Sentei, o que não fazia há anos, bem à frente dos demais alunos. Se a professora fizesse qualquer pergunta embaraçosa, eu seria o alvo. Por ventura, ela não fez. A disciplina por ela ministrada chama-se Literatura Portuguesa I. Qualquer pessoa normal que gosta de literatura acharia fantástico! Sou uma pessoa normal e gosto de literatura, mas tenho em mente que nos próximos oito/ nove meses, teremos literatura até por meio de sonhos (ou pesadelos), sobretudo porque teremos a supracitada, Literatura Inglesa, Prática em Literatura e Literatura Brasileira II. Uma avalanche de livros está emergindo. Especificamente à professora, descrição deixada por último, ela é tanto como a primeira, comunicativa, além de possuir uma biblioteca na cabeça.
Quarto dia de aula, morrendo de sono, preguiça, cansaço, sem contar as dores musculares que obtive subindo as muitas escadas da universidade, espero confiante pelos gastos financeiros, os quais se focarão nos livros, muitos livros. Se bem que não será somente o dinheiro, mas meus neurônios e tempo também serão gastos ao lê-los, interpretá-los e analisá-los. Atividades que, enquanto acadêmica, são, de certo modo, opcionais. Fico no aguardo do momento em que de facultativo passe a ser obrigatório, aí, sim, não terei alternativa. Por isso, prefiro aproveitar este momento e ler, ainda é tempo, adequado e é a minha ocupação.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Surpresa

Há semanas reclamando da invariabilidade dos dias, tive uma proposta de viagem que renovaria todas as minhas energias ao ponto de também renovar o meu desejo de continuar reclamando em troca de mais novidades. Afinal, essa surpresa não corromperá com minhas reclamações em longo prazo, pois é uma mania que tenho e sempre conseguirei achar um ponto fraco para desenvolver a insatisfação. De qualquer maneira, a pequena mudança ofuscou boa parte delas até agora.
Como prova de reconhecimento, tento documentar aqui. Uma tentativa até então não completada com sucesso por ser impossível descrever como é sentir o vento da mudança: chegar numa cidade diferente, num estado não tão longe ao que se vive e sentir que o clima ainda assim mudou: ouvir as ondas do mar; ver a formação e o desaparecimento da espuma na margem; andar descalça; sentir a temperatura da água ao mesmo tempo em que o pé afunda na areia. Tudo tão diferente! Sinto-me descansada de verdade.
Torno registrado esse fato com a justificativa de que nas presentes condições acadêmicas não será uma das minhas opções ver o mar. Logo eu que já estava desistindo de conhecê-lo, aquela que resmunga, não move um dedo para mudar, uma condicionada. Por isso é tão admirável uma alteração em meus longos dias. Tão admirável até que, em meu ponto de vista, é merecedor de um post simples em forma de agradecimento seja às minhas reclamações, aos próprios posts (haha), ou à minha sorte.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Uma venda nos olhos

Cansada de velhos pensamentos sigo de cabeça erguida tentando disfarçar minha dor. Compreendi a dificuldade em encontrar alguém capaz de proferir palavras que me confortem e me façam esquecer essa angústia. É, portanto, tarefa difícil, senão impossível, fazer alguém enxergar do meu ponto de vista tudo que me afeta. Não só o quê, mas também com que intensidade. Ainda que eu me empenhe em explicar, exemplificar, a reação que espero não será por mim presenciada e é esse o motivo da minha amargura.
Entretanto sei que agindo assim diante da pessoa, assemelho-me ao que premedita, desaponta-se e apela às reclamações, lágrimas e murmúrios. Em resumo, sou um ser egoísta que entrega a vitória em momentos de acordos, palmas e rostos iluminados em sintonia com meus fracos e imaturos argumentos. Ora sou grande com meus planos e responsabilidades, ora sou pequena para compreender que ser adulto é complicado. Acredito que enquanto pequena, isto é, enquanto criança, a magia está em desprezar o sentido pejorativo que algumas palavras não consideradas palavrões adquirem com o passar do tempo. Ter também desprezo pelo silêncio, pois desde quando ele começou a falar esforço-me para decodificá-lo. É isso o que me fere: tentar entender o que esse silêncio está falando e despreocupar-me se ele é contra ou a favor de mim. Enfrentá-lo.
Tenho medo de me transformar no adulto equivocado. Em me metamorfosear, independente de aparência ou idade, no adulto que age e que fala com desconfiança dos outros. Quero, por isso, desapegar-me de manias como o desejo de ver no meu ouvinte aquele olhar cúmplice. Em outras palavras, quero ser forte o bastante para ouvir o que ele tem a dizer e se eu cair que eu me levante com essa mesma força. Quero arrancar de mim essa insegurança, esse medo. Ser até mesmo complicada, mas ciente disso e não me esquecer de, às vezes, viver como uma criança.