quarta-feira, 27 de junho de 2012

As Magalis

Não venho aqui para deixar o leitor com vontade de chocolate e da sensação maravilhosa que se sente quando se saboreia um, ainda mais quando ele derrete na boca. Não, não é esse o meu propósito. Na verdade, a única coisa que tenho intenção de descrever é como o chocolate pode persuadir pessoas. Como ele pode movê-las a lugares que elas, antes da proposta da compra dele, não queriam ir. O chocolate muda o humor. Só não exagere, pois depois você terá muita sede e, se for alguém que apenas queria gostar o chocolate, quererá comprar um suco ou uma água e o ato genuíno de degustar o doce se polui. Coma o chocolate como se fosse uma criança, mas daquela que sabe o ponto certo de parar. 
Pois bem, estava caminhando com minhas amigas e sugeri irmos à uma loja de roupas porque hoje eu queria gastar dinheiro. Aproveitei essa vontade enquanto ela ainda estava dominando meus pensamentos, afinal, na maior parte do tempo, eu evito pensar em fazer contas. Uma das imagens que eu mais gosto de ver é o meu saldo bonitinho, acumuladinho, sendo uma prova do meu autocontrole. Uma prova do quão forte eu sou para não esbanjar em coisas supérfluas. Ainda assim, como não sou de ferro, o telecom (sistema de preços) me atrai e eu começo a fazer aquele estudo interno, por meio do conhecimento embutido, e lembrar das situações que desperdicei dinheiro, não que de fato seja um desperdício, mas por eu ser tão mão-de-vaca que para mim soa como tal, e no fim pude pagar sem peso na consciência. Sobretudo porque faço vários estudos antes de pôr a mão na carteira e porque quando dou fim a eles e a decisão é comprar, eu uso a peça adquirida com a frequência esperada e satisfatória. 
Minhas amigas aceitaram me acompanhar e me induziram a comprar sem saberem qual era exatamente o objeto de desejo de compra; apenas o impulso de gastar torná-las-ias felizes. Elas sabem desse meu bloqueio. De um lado é positivo, pois tenho um amontoado de dinheiro em um período de tempo. De outro lado é negativo, são horas de reflexões apenas para fazer uma compra. Eu tenho receio de me arrepender e lembrar que sou racional e posso evitá-lo me consome. Assim, ao ser consumida por um receio não consumo. Trocadilhos à parte, entramos na loja e logo avistei a blusinha que me apaixonara desde a primeira vista. Tão linda! Parecia estar aguardando que eu a levasse... Branca, de mangas curtas (embora estejamos numa estação não condizente) com um bordado de estrelas nas cores preta e prata na frente a formar uma caveira gigante. Desde que a vi, fiz várias combinações metafísicas com as roupas que já possuo. Contemplando aquela blusinha, hoje tive a certeza de que ela deveria ser minha. Provei. Gostei. Gastei. É minha. Quanta felicidade! 
Ok., mas o que o chocolate lá do início tem a ver com esse relato? Bom, minhas amigas ficaram olhando as roupas enquanto eu estivera no provador. Ao voltar, percebi o quanto fui grata pela singela companhia de cada uma e dos incentivos que proferiram no caminho. Com a sacola da compra na mão, chamei-as de minhas crianças e elogiei-as pelo bom comportamento: não fizeram balbúrdia alguma na loja, ação própria dos indivíduos pueris. Como recompensa, a suposta mamãe compraria um chocolate para cada uma. Promessa é dívida. Seus olhinhos brilharam de contentamento. Os meus também, pois entregue aos caprichos da gula, compartilhei daquele chocolate. Assim, desloquei-me da ocupação de mãe e passei a compor um trio de crianças glutonas.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Inconclusiva

Fazendo um apanhado de frases ao resgatar um fake (perfil falso) de uma rede social, percebi o quanto eu já possuía ciência da maldade das pessoas, embora eu não me considerasse tão madura assim ao ponto de achar as coisas tão perceptíveis como elas são hoje. Frases como "as pessoas se utilizam dos nossos defeitos para nos machucarem" e "não existem amigos, apenas colegas" me eram, desde tão remoto tempo, afins. Hoje servem como um alerta que meu inconsciente insiste em abraçá-lo para me fazer sofrer. São frases e comunidades que eu fazia parte e que se refletem atualmente no meu dia a dia. Talvez se materializaram? Nada exato.
Dizem que a palavra e o ato anterior a ela, o pensamento, têm poder. Acreditando ingenuamente nessa "regra", posso afirmar que ao martelar aquelas sentenças, anexei-as no invólucro que cobre o meu cérebro, fazendo com que elas compusessem a minha personalidade. Na época elas só eram um recurso de tentar me descrever, achar um rumo meu para comigo mesma. Entretanto essas características, que antes eram uma brincadeira "aborrescente", surtiram efeito e tudo parece fazer sentido se compará-las com a atual realidade.
O problema está em apostar nas pessoas, um sentimento que eu tento alimentar dentro de mim. Ainda acredito, sim, que há pessoas que vão se sensibilizar com o lixo da minha vida. Ops! A palavra tem poder, refazendo: [...] que vão se sensibilizar com a maravilha que a minha vida é, repleta de altos e baixos. Já passei da fase de acreditar que somos amiguinhos e um mundo melhor está por vir, mas a esperança fulgura fra(n)camente nos meus olhos.
Essa esperança se esvai não por meio de lágrimas, porque as lágrimas ainda são uma manifestação, mas por isolamento. Excluo pessoas e isso é ruim. Eu deveria aprender a conviver com o erro delas; eu também erro e muito. O meu ponto fraco está em lembrar que quando joguei as palavras que denotavam meus sentimentos e emoções em determinado momento, o receptor as recebeu com entusiasmo (e isso "quando ouvia") por estar ocupando o posto de confidente. Esse comportamento perdurou até o momento em que isso lhe foi conveniente, até os seus ouvidos serem dispensados ou substituídos. Acabou. As palavras voltam como um bumerangue, em tom jocoso para atingir e machucar. São esses alguns dos fatores que me  fazem crer que aquelas frases estão cumprindo a sentença do "The secret" e não é comum como parece ser: tudo se encaixa perfeitamente. Há outros mais pessoais também, os quais os deixo para uma próxima ocasião.
Eu não sou exemplo de pessoa bondosa, amável e carismática e se fui não quero ser mais. Gostaria, porém, de me desfazer da "capacidade de enxergar com clareza a vulnerabilidade das pessoas", como elas são aproveitadoras e chantagistas e como eu acabo me apropriando disso também. Se trouxesse algum lucro perene, mas, não, é apenas rapidamente dissolvido no ar, ainda que de modo não tácito. Incomoda olhar para as pessoas que você já despreza de algum modo e ver que elas nem percebem. Incomoda olhar para as pessoas que você já despreza de algum modo e ver que elas também te desprezam. Incomoda olhar para as pessoas que você não quer desprezar e saber que elas precisam disso. O fato de "eu estar sempre na minha, não quer dizer que não esteja vendo o que está acontecendo à minha volta."

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Vice-versa

Os elogios e as críticas causam-me certo constrangimento. Desconforto não ao alcance dos olhos de quem profere e, sim, aos olhos da alma. O acúmulo de palavras organizadas intencionadas a ter algum sentido que vai se formando na minha cabeça resulta em julgamentos. Calculo se a pessoa que tanto me elogia ou me critica realmente o faz com a intenção de me alegrar ou entristecer. Na verdade, a tradução que tenho é bem diferente daquela que supostamente se queira passar. Quando é “elogio”, para dar credibilidade ao discurso da pessoa, primeiro eu tenho que fazer uma autoanálise. O entrave nasce quando noto que não há ligação entre o que acabou de ser dito e o resultado que obtive. As provas não são contundentes e os fatos repulsam um ao outro. Entristeço-me porque alguém me elogiou e concluí que houve equívoco, e tanto faz se o erro partiu de mim ou não. Todavia, quando essa revisão que faço colide com o palavrório alheio, acomodo-me e parece não haver mais solução; está, aparentemente, acabado. No final, o produto é o mesmo.
Felizmente, críticas também me fazem cismar, pois, por que haveria alguém com o propósito de me cobrir com elas? - Para haver melhoras, claro! Para mim, críticas serão ou terão sempre algum teor positivo e isso independe de seu(s) objeto(s) de origem. Mas também não vivo só delas, uns elogios ora ou outra fazem a diferença, sobretudo porque preciso de uma autoanálise, não gosto de depender dos outros e nem sobrecarregá-los com criterioso exame, melhor dividir o peso juntos(as). Entretanto, no momento em que não há essa separação de tarefas e alguém ousa me criticar é porque, no fundo, deseja que eu melhore, pois se quisesse que a minha evolução estancasse me elogiaria. É muito lógico, pois tais venenos inquietam-me; fazem-me querer mais e obrigam-me a andar, correr, ir para frente e me distancio ao ponto de eles não me fazerem efeito. Venenos que se tornam a cura. Sigo na trilha da incansável busca da realização pessoal.
Precisamos estar de bem cá dentro. Seja no coração, na cabeça ou no estômago. Se o coração, como magistralmente faz Camilo em seu livro “Coração, cabeça e estômago”, não proporciona os galanteios que almejamos, parte-se, então, para a cabeça. Ocupa-a com leituras, somas e subtrações, publicações, etc., e se ainda não obter lucros, aposte no estômago, afinal, se nem alimentando o coração com ilusões fugazes ou a cabeça com os nutrientes intelectuais, debruce-se numa lasanha, por exemplo: um momento tão individual quanto prazeroso. Só não exageremos, evitando, desse modo, o mesmo fim de nosso protagonista e exemplo parcial, Silvestre. O progresso dele teve que parar. Até lá, desde que saciemos o que mais nos for conveniente, vivamos com críticas e/ou elogios e vice-versa.

domingo, 10 de junho de 2012

Não somos o poema

O problema é pensar que existimos. Achamos que nossas palavras são permanentes, sólidas capazes de nos representar para todo o sempre. Isso não é verdade. Escrevemos no momento. Muitas vezes, quando leio meus poemas durante uma apresentação, percebo que as pessoas acham que os poemas sou eu. E não são, mesmo quando falo em primeira pessoa. São meus pensamentos, minha mão, meu espaço e minhas emoções naquele determinado momento em que os escrevi. Observe-se. Mudamos a cada minuto. E isso é uma dádiva. A qualquer momento podemos abandonar nossos sentimentos e ideias cristalizadas e começar tudo de novo. A arte de escrever é assim. Em vez de limitar, liberta. -- Goldberg, Natalie. Escrevendo com a alma.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

O corante da pipoca

Hoje minha mãe foi ao Corpus Christi e trouxe-me um pacote de pipoca e foi como um tiro na memória, porque me lembrei de quando eu era criança e a acompanhava nas novenas às quartas-feiras de manhã na Igreja São José. Confesso que eu não gostava muito de ir e nem sabia rezar direito. Acho que nenhuma criança sabe e se há alguma que saiba, eu fazia parte das que não se importavam em não saber. Aliás, o padre falava um bocado e eu não entendia bulhufas. Enquanto ouvia seus murmúrios, eu imitava a expressão séria das pessoas que pareciam tê-lo como foco.
Nessa busca de assemelhar-me aos outros, eu me remexia de um lado para o outro e cansava daquela mesmice, as crianças não costumam gostar da igreja. Minha mãe, ao perceber que logo eu suplicaria por sair, falava que, com a condição de me comportar, no término eu seria premiada. Chantagem de pais, eu sei, mas surtia efeito e eu sempre caía, me silenciando. Quando não suportava mais e começava a cochichar, a lembrança de ganhar alguma coisa pelos bons modos me vinha à mente e eu me policiava. Agia feito uma princesinha, conforme me havia sido solicitado. Não que eu tivesse a oportunidade de conhecer alguma princesa, mas era uma artimanha da mãe me elogiar como tal sabendo que eu sonhava em ser uma.
O tempo não passava. Terminado o sermão, vinha a consagração da hóstia. "Ora, ora! Quando ele vai dar a bênção final?" Possivelmente aos meus oito anos de idade eu não pensasse em "Ora, ora!", contudo foi a única interjeição encontrada que consegue revelar parte da minha pressa infantil. Não sabia por qual razão todos se ajoelhavam e eu tinha que fazer o mesmo. A minha vontade era a de ficar voltada para trás e examiná-los. Além disso, eu já havia me comportado bem àquela altura e pensava que eles deviam ver o rosto da princesa. Acima de mim, porém, havia um olhar de censura que me estremecia por dentro e me obrigava a ficar para frente sem hesitar: um receio de não ganhar o tal prêmio estava me dominando. Ninguém reconheceria a filha da rainha, por causa da própria majestade!
Após um longo falatório e uma pausa, dávamos as mãos e rezávamos o Pai-nosso. Era até bonito de se ver, parecia que realmente a paz reinava naquele instante. Aí, era a hora da Santa Comunhão e duas filas eram formadas. Pela ânsia de sair dali e ser premiada, esquecia-me desses detalhes e me desanimava, chegando ao limite de desistir do prêmio. Quando todos voltavam aos seus lugares e eu havia me decidido em me rebelar, minha mãe agarrava-me com delicadeza pela mão e me puxava para fora do banco e seguíamos em direção de uma senhora que vendia pipoca.
Meus olhos brilhavam em ver que havia duas opções: pipoca salgada ou doce. Em casa a mãe fazia sempre da salgada e a isso se devia a escolha da doce. Chegava a me divertir em olhar ambas no carrinho, pois o colorido desta fazia contraste com a brancura daquela. No caminho encontrávamos outras crianças que também haviam sido premiadas pelo bom comportamento. Sentia-me mais racional ao comparar as pipocas, pois, certamente, os pirralhos que haviam comprado da salgada não fizeram a prévia reflexão como eu. Hoje tenho outro ponto de vista em relação a esses acontecimentos e perdoe-me se fui uma criança calculista, era o máximo que eu podia chegar. Só não mudei na parte do prêmio, pois ele conseguiu ter o mesmo efeito de outrora; e tudo porque eu associei diversão às cores da pipoca. Quanta simbologia!

domingo, 3 de junho de 2012

Manias

A palavra "né" se reduziu da expressão "não é" e é usada por qualquer pessoa, com qualquer idade, nível de escolaridade, região. Independente do local onde se trava uma troca de ideias, seja em explicações acadêmicas ou em conversas corriqueiras que não exigem tanta formalidade, o "né" comparecerá. Essa palavra se posiciona no final das frases acompanhada daquele tom interrogativo, denotando a nossa necessidade de sermos entendidos. Além disso, a frequência com que o "né" surge nas relações de comunicação humanas é absurda. Mais absurdo é saber que seu uso é como uma pandemia, resultando num público contaminado que não se medica, contribuindo para que a "doença" se alastre catastroficamente. Isn't it? Ultimamente estou mais atenta aos erros humanos (exceto aos meus!) do que em qualquer outra época e, por isso, venho questionar a respeito da assiduidade de determinadas palavras que se tornaram vícios. É bem provável que eu tenha decidido manifestar-me ou para não assimilá-los ou para corrigi-los -- justificando os parênteses.
Saltando do "né" para o "daí", afirmo que este é o mais triste de todos, pois das suas cem aparições, o "daí" é dispensável em noventa e nove. Na tentativa de dar continuidade e coerência ao texto, o caráter empobrecedor sempre o acompanhará. O interlocutor mais perspicaz logo traçará o perfil do locutor por meio do emprego linguístico do "daí". Certamente será atribuída a denominação de proprietário de um vocabulário paupérrimo ao emissor descuidado. A única vantagem do "daí" é a rejeição que lhe é atribuída por alguém que, de fato, anseia por ser mais polido e não ser considerado carente de vocabulário. Afinal, descobrem-se outros mecanismos de ligação das frases com o mesmo papel: "então"; "posteriormente"; "depois", e a própria omissão. É uma questão de iniciativa e, tanto para quem fala quanto para quem ouve, o texto ficará mais interessante.
Interessante. Essa palavra também está se tornando um problema na sala de aula. Eu fico sentada durante três horas e meia e quando ouço frases como "Muito legal!"; "Muito importante!" elas não conseguem ser tão pontiagudas no meu cérebro (porque a essa altura não há coração que aguente) quanto o "Muito interessante!". A vontade de escrever um palavrão aqui no post é grande, mas me conterei e limitar-me-ei ao "Poxa!". Poxa! Como um texto/tópico/assunto/discussão não será importante se foi você quem escolheu debater? Mesmo que não seja, deve existir alguma "interessância" (neologismo), pois não estaria(m) sendo exposto(s) a esmo. 
Existem muitas outras manias das quais eu poderia falar, porém prefiro estender-me num próximo post. Para hoje minha sugestão é: lute por dispensar o "muito interessante; muito importante; muito legal; né; daí; entendeu; sabe como; tipo etc." num ambiente em que a sua competência possa estar em xeque, em avaliação. Sobretudo se estiver na presença de um (a) professor (a). Se for dO professor ou dA professora, com artigo definido, seja ainda mais intolerante a esses discursos vazios. Não peço apenas por mim, peço também pelos (as) profissionais que, suponho, estudaram para formar professores (refiro-me aos cursos de Licenciatura, evidentemente) e ouvem essas peripécias linguísticas. Ninguém precisa disso: nem eu, nem eles, nem você. Desafie-se. Se realmente há algum posto que se deseje atingir e ele, porventura, exija capacidade, busque por ser mais convincente aos receptores; a comunicação é um dos primeiros requisitos, seja ela verbal ou não verbal. Encontremos a segurança! Eu também entrarei na batalha, porque estamos num contínuo processo de aperfeiçoamento e, embora não alcancemos a perfeição, queremos ter voz. Particularmente, quero que a minha ecoe de modo inteligível. Só competindo comigo mesma é que vou descobrir até que ponto eu posso chegar, mesmo que tal feito se torne uma mania.